Não me olhes nos olhos

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Esse teu rasgo de confiança no teu olhar, intimida-me. Deixas-me sem palavras. Vezes sem conta. Quando me apercebo ali estás, especado como sempre a tirar medidas próprias de quem sabe o que vê. E quando me vês, penetras na minha alma. Afinal de contas, tu sabes, deixas-me sem palavras.
Desligo-me facilmente da multidão que nos rodeia e concentro-me em ti. Não te falo mas analiso cada gesto que articulas despreocupadamente como se nada te afectasse. Daí não verbalizar o contexto que nos envolve, guio-me apenas por esse olhar que procura algo mais do que a vida te tem dado. Curioso que não te intimidas com a minha resposta, preferes invadir-me com argumentos incisivos. E eu, em jeito trouxa, fico de novo sem o que te dizer. Prefiro reagir assim, atrapalhada e timidamente, como no meu primeiro beijo de prazer.
Esse teu rasgo de confiança, ultrapassa-me. Quando me olhas nos olhos, denuncias-me. Evito, por medo de rejeição, de ser descaradamente descoberta e tornada peça de arte vulnerável a críticas de quem não sente o que fala.
Não me olhes, não me denuncies. Torna-me antes tua, vê-me por dentro como nunca ninguém me viu e faz-me crer, que esse teu olhar ganhou vida. Aquela que procuravas em vão nas outras que não te temiam, e não ali, naquele momento, em que me abri à evidência de sentir o que o teu olhar não viu.
Vou permanecer no silêncio e guardar este meigo recordar que por ti, por causa de ti, vi o que realmente senti.
Boa noite. Dorme bem.

Sushi do Dia

A nossa visão só se torna clara quando conseguimos olhar para dentro de nós. Quem olha para fora, sonha; quem olha para dentro, desperta.
Carl Jung

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