Arminda
11:21O ar está húmido, vê-se a geada com o reflexo nascente do sol. A casa fica ao fundo da rua, empilhada nas pedras da história, de estórias enclausuradas, fechadas e esquecidas no tempo. A porta de madeira, ligeiramente encavalitada deixa passar frechas de frio. A casa é simples. Dela, apenas.
Ali viveu, escolheu ditou e procurou a verdade de sentir apenas uma vez aquilo a quem nem todos chega um dia, pelo qual esperamos e não chega, não chega... O amor áureo de outros tempos, tempos de submissão e paixão inconsequente, amor proibido e decidido pelos outros que não sabem, não querem saber. Mas que obrigam e fazem sofrer pela obrigação da satisfação pessoal dos outros e não nossa.
Arminda. Amou uma vez. A única vez e somente essa vez. Um amor tão grande e intenso que a fez sobreviver, dia após dia, ano após ano, longe. E o coração permaneceu quente e aquecido, cheio de vida para nunca a deixar partir sem a plenitude de realmente sentir aquilo que todos queremos e não temos, não temos...
A casa lá está, fria, coberta de musgo do frio nortenho, ainda de pedras empilhadas e memorizadas pela história de Arminda. Uma mulher só mas tão acompanhada e aquecida que viveu mais do que ninguém, só pela estrada fora. Um coração sempre cheio na esperança de um dia voltar a ver, voltar apenas a ver, a ver quem lhe permitia tal emoção, que lhe foi arrancada, queimada, desfeita, atirada ao poço mas que não deixou, de tal maneira que não deixou que viveu para sempre...
Ainda se sente o amor naquela casa fria, distante naquela estrada de pedra, entre árvores e riachos e pedras, muitas pedras.
Governou a casa como o coração. As pedras falam-nos de como todos os dias lhe falava e lhe cantava. Ainda ecoa a sua voz dentro das quatro paredes singelas. Ainda. É uma bênção.
Fechou os olhos no conforto do coração e foi ele que lhe estendeu a mão. Guiou-a todos os dias e agora está sentado ao seu lado a viver aquilo que nesta vida não viveram. E ainda se sente...