ver partir
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Distribuem-se, aos poucos, para longe do berço, do lugar onde nasceram. Uma onda, uma vaga, uma partida longa. São muitos os que saem. Uns à toa, sem destino, outros com propostas e promessas garantidas. E todos, com um objectivo comum, encontrar «uma vida melhor».
A causa é justa.
Fala-se de uma geração mal gerida, mal criada. A quem foi
pedido um esforço nos estudos por ser o passaporte de uma vida melhor. A quem,
os pais, pagaram tudo. Findo um século e pouco de dedicação às leituras, aos
testes, às cábulas, às apresentações, aos exames e às provas orais caem como
torpedos. Não têm experiência, não sabem para onde vão, nunca
sentiram as dificuldades dos pais que cedo cresceram na exigência do trabalho,
sem grandes sonhos. Apenas de que os seus filhos teriam de tudo, um pouco
melhor.
Miguel, 32 anos, licenciado em Biologia.
«Emigrar foi para mim um acto espontâneo. Desde o início da minha vida académica que o meu caminho estava a ser preparado para emigrar, sempre tive este objectivo, por ser importante para a minha profissão e também por me fazer crescer enquanto pessoa.»
Reside actualmente em Basileia.
Concretiza o objectivo, o programa de doutoramento na
prestigiada Novartis. É o seu lugar de destino porque fez uma escolha.
«Escolhi uma actividade profissional que em Portugal não é respeitada nem bem remunerada. Todos os anos o investimento em ciência cai em Portugal, o que torna mais difícil conseguir apostar no desenvolvimento e tecnologia.»
Na mala levou uma bola de râguebi e a saudade da família e
dos amigos. Regressa nas épocas festivas e é na Suíça que desenvolve as suas
competências profissionais, por lhe garantir possibilidades de futuro.
Lara, 29 anos, licenciada em Arquitectura.
Emigrar é a atitude encarada desde a nascença. Natural da
Suíça, veio para Portugal com nove anos.
«É um acto espontâneo por querer um futuro mais risonho».
É com sorriso de satisfação que vê reconhecido o seu
trabalho. Ao fim de uma semana, e por já conhecer este mercado de trabalho,
arranjou emprego.
«Vim para Basileia por já conhecer bem a cidade e pelas óptimas condições de trabalho. Em Portugal era desempregada e sabia que aqui iria ter grandes possibilidades de um futuro melhor.»
Na ambiguidade do espaço aeroporto, despedem-se de uns e abrem
as portas do amanhã. Lara carregou a mala de 20 kg e pagou excesso de bagagem por culpa da saudade. Não regressa, só no Natal para se reencontrar com a família que ainda aqui vive.
Separam-se dos pais.
Dividem-se pelo mundo, quebram-se
amizades, procedem-se novas, seguem viagem, retiram-se daqui, deste pequeno
país. Fogem para o amanhã, afastam-se de contas que afinal não lhes competem,
confinam-se ao desconhecido, à esperança.
Inês, 28 anos, licenciada em Comunicação Social.
«Para mim emigrar é um misto. Sempre foi um desejo, o de viver uma experiência internacional mas feliz ou infelizmente a situação económica do país incentivou a minha decisão.»
Ruma para Amesterdão. Reúne nesta nova terra
condições para batalhar por um lugar no mercado de trabalho, com o apoio do
namorado e amigos que por lá residem.
«Quero partir pela experiência pessoal. Testar os meus limites e acima de tudo crescimento. Se puder fazer isso e ainda evoluir profissionalmente, melhor.»
Todos partem, todos vão partir. Uma moda, uma tendência, uma
oportunidade, uma obrigação. Seja como for, a viagem de volta não consta na
lista de prioridades. Em comum, encaixam entre peças de roupa, sapatos e
fotografias, o enredo da saudade.
Deste lado, simplesmente em Portugal, vemos partir.
Deixamos partir.
(Dedico este texto a todos que vejo partir e me fazem ter
saudades. Que o reencontro não dure a vida toda).